
Os primeiros modelos eléctricos acabam de chegar a Portugal, prometendo revolucionar a forma como encaramos o automóvel. A questão passa por saber se esta primeira vaga eléctrica será compensadora para um utilizador particular?
Texto Luis Guilherme e Nelson Oliveira Fotografia Miguel?Ângelo?Silva, iStockphoto e Oficiais
FEVEREIRO 2011
"2011 será o “ano zero” da era eléctrica em Portugal??Pode muito bem ser. Pelo menos, a chegada ao mercado nacional das primeiras propostas 100% eléctricas oriundas dos grandes fabricantes está a gerar muitas expectativas junto de uma boa parte dos condutores lusos, não só pela promessa de um corte radical com a tradicional e sempre penosa ida à “bomba”, como pela forte campanha mediática fomentada pelos fabricantes e, também, pelo próprio Governo português, que até criou um programa de apoio e incentivos fiscais específico para esta área.
O sector das energias alternativas tem sido uma das bandeiras do Governo, e os veículos eléctricos são vistos como a “cereja no topo do bolo” do projecto das energias renováveis em Portugal. A questão que se coloca neste momento é perceber até que ponto a opção eléctrica é vantajosa para o consumidor particular, até porque existem algumas condicionantes, bem patentes nos elevados preços dos primeiros modelos eléctricos e na sua autonomia limitada. Vamos, por isso, passar em revista alguns pontos chave destas promessas eléctricas.
IMPULSO CERTO

A entrada em cena dos veículos eléctricos promete revolucionar o conceito de mobilidade urbana, e mesmo a forma como nos relacionamos com o automóvel. Afinal, o cliente de um veículo eléctrico, pelo menos nesta fase inicial, vai ter de alterar vários hábitos e começar a pensar as suas deslocações em função da carga da bateria (ver caixa).
Esta tecnologia sempre esteve disponível e até houve vários ensaios falhados nas últimas décadas. Mas só hoje se criaram as condições certas para os fabricantes automóveis avançarem para a produção em série de modelos eléctricos de todas as formas e feitios e justificar os avultados investimentos nesta tecnologia.
Um dos factores que justifica, a médio prazo, esta aposta passa pela estimativas de crescimento da população urbana e do parque automóvel. Em 2050, mais de 70% da população mundial vai viver em áreas urbanas; e as vendas globais de automóveis deverão superar, já em 2020, a fasquia das 100 milhões de unidades por ano. Estes são factores que criarão, decerto, uma pressão enorme sobre a qualidade de vida nas cidades e justificam uma mobilidade urbana “limpa” e sustentável.
Mas este factor “ambiental” não justifica, só por si, o investimento das marcas. O impulso decisivo surge com a escalada do preço dos combustíveis e a necessidade de vários países de se libertarem da dependência energética dos combustíveis fósseis. A entrada em vigor de cargas fiscais dependentes das emissões de CO2 na maioria dos estados europeus, e as cada vez maiores restrições impostas aos próprios fanricantes neste domínio, tornaram a aposta em veículos “limpos” uma imposição para todas as marcas.
EXEMPLO PORTUGUÊS
As razões para Portugal ser um país “amigo” dos eléctricos devem-se, além da geografia do país, ao forte investimento do Governo nas energias renováveis. Estas sempre foram uma bandeira do programa do actual executivo, que as elege como a forma mais “natural” de reduzir a dependência do país da flutuação dos preços dos combustíveis fósseis no mercado mundial.
Esta aposta tem-se traduzido na criação de vários parques eólicos espalhados pelo país e na central fotovoltaica da Amareleja, em Beja, permitindo a Portugal estar na linha da frente neste sector a nível europeu. Segundo os últimos dados oficiais, as centrais eólicas asseguram cerca de 33% da produção total de energia do país.
No entanto, esta energia eólica é altamente subsidiada pelo Estado, através de programas de incentivos, e ainda não é competitiva sem a ajuda governamental. Por isso, os veículos eléctricos são vistos como uma boa solução para rentabilizar a produção de energia renovável em Portugal e tornar mais “palpável” a interacção entre o utilizador e a rede energética.
Aliás, o próprio conceito do veículo eléctrico ajusta-se bem ao nosso “caso particular”, pois o processo de recarga das baterias será feito, na grande maioria dos casos, durante a noite, quando os veículos ficam estacionados na garagem. Tendo em conta que toda a produção de electricidade em Portugal durante o período nocturno provém de fontes renováveis, e parte dela acaba por não ser utilizada devido ao fraco consumo, o veículo eléctrico é uma solução quase perfeita para aproveitar esta energia altamente “subsidiada” e acabar com o “desperdício” energético.
PRIMEIRA VAGA
A primeira vaga de automóveis eléctricos em Portugal deverá ser destinada, em grande parte, às frotas de empresas ou a institutos governamentais – quer por ser uma opção competitiva para algumas operações logísticas, quer por se assumir como um óptimo instrumento para tornar mais “verde” a imagem da instituição em causa.
É certo que os clientes particulares vão também fazer parte desta equação, mas numa escala mais reduzida. Isto porque o perfil do cliente-alvo particular ainda é algo exclusivo (ver caixa), devido às condicionantes da tecnologia. A noção de nos libertarmo das flutuações constantes dos preços dos combustíveis, normalmente desfavoráveis ao nosso orçamento, é tentadora e apelativa, mas é preciso ponderar muito bem a nossa escolha, pois ela implica algumas concessões.
Para quem tiver condições ideais para acolher no seu lar um eléctrico e gostar de se considerar como um early user das novas tecnologias, o veículo eléctrico acaba por ser uma escolha viável e, até, desejável.
Já a grande fatia dos consumidores terá de aguardar por novos desenvolvimentos tecnológicos, que permitam estender a autonomia eléctrica, e também pela previsível descida dos preços dos modelos, a qual irá ocorrer com a democratização da oferta. De qualquer forma, o primeiro passo está dado para a criação de uma alternativa “mais saudável” no mercado automóvel, que poderá beneficiar não só o ambiente como tornar mais positiva a nossa ligação ao conceito de automóvel. "
Em: http://www.automotor.xl.pt/0211/1200.shtm