Ao fim de cinco dias ao volante do Nissan Leaf, foi-nos quase «penoso» regressar ao mundo real...
"A ideia do carro eléctrico cria em muitos algum cepticismo. Seja porque não conseguem mudar do paradigma actual para uma realidade completamente diferente, seja porque colocam muitas reservas às capacidades dinâmicas desta nova solução de mobilidade… A reduzida autonomia e o preço ainda elevado das propostas apresentadas são um obstáculo grande à sua aceitação. Uma coisa é certa, depois de se utilizar no dia-a-dia da cidade um carro eléctrico, tendo condições para o carregar em casa, já não queremos outra coisa.
A verdade é que o Nissan Leaf pode levar os menos habituados a um carro eléctrico à beira de um ataque de nervos, devido à limitada autonomia das baterias e à escassa rede de carregamento. Mas depois de alguns dias ao volante, a experiência acaba por nos ensinar como tirar o melhor partido de um automóvel amigo do ambiente e da carteira.
O Nissan Leaf é um carro tecnologicamente evoluído e complexo, que se conduz como um automóvel vulgar. Na realidade, quem já esteja habituado a veículos com transmissão automática, não sentirá grandes diferenças. Para os que não estão, provavelmente sucederá o mesmo que nos carros dotados de caixa automática: é um hábito que se entranha, tal é a comodidade que se ganha ao dispensar o uso do pedal de embraiagem e deixar por conta da electrónica as variações de velocidade.
Ora se exteriormente o Nissan Leaf apresenta uma estética capaz de despertar a atenção – provoca, certamente, menos estranheza do que o primeiro Toyota Prius quando foi lançado – é principalmente no interior que se evidenciam as maiores novidades deste automóvel. Embora, à partida, não exista muito com que estranhar: um volante convencional e dois pedais, como qualquer veículo com caixa automática. Só que, principiando exactamente na forma e função deste manípulo e prolongando-se pelo painel de toque multifuncional na consola central, o que não faltam são surpresas.
Este painel fornece a quase totalidade das informações necessárias para a condução de um Leaf. Nomeadamente carga da bateria, consumos e autonomias, bem como informação sobre os postos de abastecimento mais próximos. Além de memorizar todos os locais onde se efectuaram cargas, incluindo residências particulares…
Familiar confortável
Com lotação para cinco ocupantes, o Nissan Leaf é assumidamente um familiar do segmento médio. Confortável, principalmente. Em termos de insonorização não existe igual neste segmento, pelo mínimo ruído de rolamento, a par da ausência do barulho tradicionalmente emitido por uma motorização a diesel ou a gasolina, que podem surpreender os mais incautos, em particular nos parques de estacionamento dos centros comerciais…
O interior revela-se espaçoso e mesmo o lugar do meio atrás beneficia da ausência de túnel central. Os revestimentos mostram-se, em geral, num bom plano. O tablier algo "plastificado" é compensado com a superfície suave que reveste as portas. Até a capacidade da mala é razoável face ao espaço ocupado pelas baterias: cerca de 330 litros ou 680 com o rebatimento dos bancos traseiros. Profunda, a mala está parcialmente separada do habitáculo pela “caixa” onde se aloja o conjunto de baterias que alimenta o motor.
A simplicidade de utilização – comandos óbvios e funções controláveis em ecrã táctil – é a nota de destaque. O manípulo que comanda os modos de condução tem a forma de um "joystick". Além dos modos semelhantes às de uma caixa de velocidades automática existe uma função Eco, que maximiza a regeneração de energia quando se levanta o pé do acelerador e nas travagens, carregando a bateria. O binário máximo, debitado pelo motor eléctrico com uma potência equivalente a 108cv, está disponível desde o arranque, permitindo um desempenho acima do esperado.
Em estrada
Em estrada, o Leaf pode chegar aos 147 km/h (o que, claro está, constitui crime rodoviário e se desaconselha), mas o tempo que se circular a velocidades acima dos 90 km/h será directamente proporcional à redução dos quilómetros de autonomia indicados no painel de instrumentos. É que o Leaf, tal como todos os eléctricos, está talhado para percursos urbanos, onde as travagens e desacelerações ajudam a preservar a carga na bateria, ficando rapidamente sem fôlego quando só se pisa o pedal da direita.
Pensar no Leaf como um modelo eléctrico de limitadas capacidades dinâmicas é profundamente errado. Tudo porque é muito fácil exceder os limites legais de velocidade, tal é a facilidade com que a velocidade aumenta (desde que não estejamos totalmente obcecados com a autonomia), podendo mesmo tornar-se divertida a condução. Apesar de uma afinação focada no conforto, a suspensão revela um elevado equilíbrio em todas as situações, mesmo nas curvas mais rápidas.
A sua suavidade e a excelente insonorização iludem o andamento, a par do facto do conjunto eléctrico dispor de um elevado binário: 380 Nm proporcionam-lhe uma aceleração inicial e recuperações capazes de pôr «em sentido» alguns adversários de ocasião. Uma carga completa proporciona uma autonomia potencial de 160 km, com esta a depender de diversos factores: temperatura exterior, utilização do ar condicionado e, principalmente, o tipo de condução adoptado. Por exemplo, em modo «eco», menos enérgico, e muita calma na condução, conseguimos, na melhor tentativa, percorrer 148 km, enquanto no modo «Normal», o melhor que conseguimos foi de 114 km. Um "eco-indicador" no painel apresenta o estado de consumo eléctrico, prestando um “feedback”, em tempo real, da eficiência de condução do condutor. Não faltam mesmo as «eco-trees» que se formam no painel de instrumentos para premiar uma condução mais ecológica...
No dia-a-dia
Antes de mais, uma constatação óbvia: quem não tiver uma garagem onde recarregar o automóvel durante a noite poderá ter algumas dificuldades de mobilidade. Isto porque, no dia seguinte, a simples missão de chegar ao emprego dependerá muito da carga que restou acumulada na bateria e, naturalmente, da distância da residência ao local de trabalho. Mesmo levando em conta que, segundo os levantamentos apregoados pelas marcas, cerca de 80 por cento dos automobilistas, percorre uma média diária inferior a 100 quilómetros.
Para uma distância casa-emprego na ordem dos 15/20 quilómetros, residir num prédio sem garagem pode complicar o que parece simples. A solução pode ser a possibilidade de carregamento nas tomadas dos parques de estacionamento próximos do local de trabalho, embora sejam poucos os que dispõem de tomadas devidamente preparadas para o efeito... Depois há ainda que contar com deslocações mais longas inesperadas, onde se torna evidente as limitações de autonomia do Leaf e a falta de postos de carregamento. Pelo menos, para já...
Este modelo pode ser carregado até 80% da sua capacidade total, em menos de 30 minutos, num posto público de carregamento rápido. Para aceder aos postos públicos é necessário dispor de um cartão MOBI-E (consórcio de empresas encarregues do sistema de mobilidade eléctrica em Portugal), o qual contém informações e debitará, em euros a energia consumida. Até ao final do ano, a carga nestes postos é gratuita de forma a incentivar a compra de veículos.
Em casa é possível fazê-lo através de uma vulgar tomada de 220V com 16A de capacidade. Demora aproximadamente sete a oito horas para uma carga completa. Isso pode ser feito durante a noite para beneficiar dos preços mais reduzidos da electricidade nas horas fora de ponta. O preço total de uma carga, contabilizados diversos custos fica abaixo dos três euros. Fazendo as contas por alto, o Leaf consome em média dois euros aos cem, o que comparado com um automóvel diesel ou a gasolina é uma diferença algo significativa, especialmente agora, com o constante aumento dos preços dos combustíveis.
Conclusão
No fundo, a maior limitação do Leaf é estar destinado a quem tenha garagem com ficha própria, para o poder carregar de noite. Porque a rede de carregamento é ainda claramente insuficiente e o tempo de carga bastante longo. De resto, é um normal familiar, com ampla habitabilidade e enorme facilidade de condução.
O Leaf está disponível em Portugal por 35.990 mil euros. É caro? À primeira vista sim, mesmo com os 5000 euros de incentivo fica quase seis mil euros acima de um Ford Focus diesel. Mas, com os carregamentos nocturnos em tarifa bi-horária, os custos de utilização são muito baixos."
Em: http://www.autoportal.iol.pt/testes-e-c ... issan-leaf